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Jornalismo Científico

Resgatando a História Oculta: Protagonismo Indígena nos Séculos XX e XXI

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Por Jefferson vicente da Silva e Stephanie Larissa Freitas dos Santos – Estudantes de Jornalismo da Universidade Federal de Alagoas

Michelle Macedo é doutora em História pela UFF e professora na UFAL desde 2013. Atua principalmente na área de História do Brasil República, com ênfase nos estudos de História Política e História Indígena.

A pesquisadora
Apresentando-se como professora de História Indígena no curso de História da UFAL, ingressou na instituição em 2013, direcionando sua atenção para esse campo específico. Embora sua pesquisa durante o mestrado e doutorado tenha sido sobre o Brasil Republicano no século XX, com um foco em História Política abrangendo os períodos Vargas e a Ditadura Civil-Militar, seu contato com a bibliografia e pesquisas da História Indígena começou durante seus estudos para o concurso. Ao perceber a escassez de produções sobre o tema no período republicano, especialmente em comparação com os períodos colonial e imperial, esse silêncio despertou seu interesse. Desde então, ela tem se dedicado a explorar e promover estudos sobre a história dos povos indígenas no Brasil, especialmente no contexto republicano.

Ao longo dos anos, porém, ela começou a perceber uma crescente demanda por esse campo de estudo na sociedade alagoana. Convites para participar de eventos e discutir questões relacionadas à História Indígena tornaram-se mais frequentes, impulsionando-a a explorar essa área de pesquisa. Além disso, a própria ancestralidade indígena de Michelle desempenhou um papel significativo em sua jornada. Apesar de não se identificar como indígena por falta de um contato mais profundo com sua família, ela descobriu suas raízes no povo Puri, do norte do Rio de Janeiro, o que despertou um interesse pessoal cada vez maior.

Financiamento da FAPEAL
A concepção do projeto de pesquisa surgiu com a divulgação de um edital da FAPEAL, que oferecia incentivos para projetos de pesquisa na área de humanas, relata Michelle Macedo. Lançado em 2022, o edital foi a oportunidade que ela precisava e, ao se inscrever, foi agraciada com o financiamento da FAPEAL. Ela acrescenta: “Este projeto reúne pesquisadores de diversas regiões do Brasil, e até mesmo um pesquisador da Espanha, que se dedica ao estudo dos indígenas brasileiros durante a ditadura civil militar.” Michelle destaca também a participação de pesquisadores indígenas, principalmente da UFAL, tanto do mestrado quanto da graduação, além de outros pesquisadores de diferentes partes do país. “O objetivo principal do projeto é desenvolver pesquisas nessa área, culminando na publicação de uma coletânea,” explica ela. “Esta coletânea será lançada durante o evento que estou organizando, a ser realizado na UFAL em outubro.” Ela conclui: “Estamos ainda em processo de preparação da coletânea, em colaboração com os pesquisadores indígenas e não indígenas envolvidos no projeto”

Além disso, relata Michelle, “esse ano, quando a UFAL lançou o edital PIBIQ, tive a ideia de submeter ao edital do PIBIQ, da UFAL, solicitando duas bolsas e duas vagas para voluntários e fui contemplada também”. Ela esclarece que o projeto está sendo financiado pela FAPEAL, mas também é um projeto do PIBIQ. A pesquisa é composta por alunos da graduação do curso de História, que estão desenvolvendo pesquisa nessa área da história indígena no período republicano.

O Projeto de Pesquisa
Durante décadas, a história oficial do Brasil relegou os povos indígenas a um silenciamento construído ao longo dos séculos XIX e XX. Sujeitos a estereótipos simplistas, eram retratados ora como seres puros e inocentes, ora como feras violentas prontas para atacar a civilização. Essa narrativa colonial permeou a sociedade brasileira, ditando padrões de comportamento e interpretações das relações sociais.

É por isso, que a pesquisa “A Presença dos Povos Indígenas no Brasil Republicano: por uma outra narrativa da História” coordenada pela professora Michelle Macedo pretende contribuir para o conhecimento historiográfico sobre os povos indígenas, destacando suas diversas formas de resistência e adaptação ao longo da história brasileira. Ao desvelar essa história silenciada, busca-se promover uma reflexão sobre as relações sociais e políticas no Brasil contemporâneo, pautada na valorização da diversidade étnica e cultural do país.

A pesquisa proposta visa revisitar a história do Brasil, questionando categorias coloniais e essencialistas. Objetiva-se identificar e analisar o protagonismo dos povos indígenas nos séculos XX e XXI, desconstruindo o mito do desaparecimento e propondo abordagens mais democráticas e decoloniais.

A metodologia adotada para a produção do estudo parte da compreensão das relações de poder contemporâneas, ancoradas na colonialidade e na modernidade eurocêntrica. Fontes históricas, como documentos do projeto Armazém Memória e entrevistas com lideranças indígenas, serão cruciais para reconstruir essa narrativa oculta.

A pesquisa retrata que o “sistema de verdades” colonial estabeleceu categorias rígidas que dificultaram a desconstrução do mito do desaparecimento inevitável dos povos indígenas. Mesmo após a colonização, a estrutura social consolidada persistiu, reproduzindo o racismo e negando a legitimidade dos povos originários.

Ainda no século XIX, o debate sobre a identidade nacional alimentava a ideia de mestiçagem como característica do processo de construção do Brasil. Termos como “caboclo” e “pardo” que ainda são utilizados até os dias atuais negavam a identidade indígena, justificando a retirada de seus direitos territoriais.

Além disso, o indigenismo republicano reforçou noções de primitivismo e atraso cultural, relegando os povos originários a um estado transitório e superável. Agências indigenistas surgiram com o propósito de assimilá-los à civilização, mas o mito do desaparecimento persistiu.

Contudo, nas últimas décadas do século XX, o Movimento Indígena Brasileiro emergiu, desafiando os critérios colonialistas de classificação social. Lideranças indígenas reivindicavam seus direitos e participavam ativamente do debate público, contrariando a crença no seu desaparecimento iminente.

No entanto, ser pesquisador no Brasil não é fácil e envolve uma série de dificuldades, sobre isso Michelle comentou que alguns dos principais desafios são a escassez de recursos financeiros, a complexidade da burocracia para obtenção de verbas e a falta de preparo dos pesquisadores para lidar com esses processos. Além disso, a ausência de uma equipe técnica de apoio para gerenciar os projetos e a sobrecarga de trabalho dos pesquisadores, que muitas vezes desempenham múltiplas funções na universidade, também são fatores que dificultam o avanço da pesquisa no país.

Além disso, ela comentou que essas dificuldades são ainda maiores quando se trata das pesquisas voltadas para a área de humanas “em quantidade de editais, as áreas tecnológicas e as áreas biomédicas possuem muito mais editais disponíveis do que a área de humanas e o recurso que recebemos é infinitamente menor do que para as outras áreas, ficamos totalmente prejudicados com relação a essa distribuição de recursos”, destaca a professora.

Essa disparidade na distribuição de recursos não apenas prejudica os pesquisadores, mas também impacta negativamente o avanço do conhecimento e a compreensão da história e da cultura brasileiras. Sem investimentos adequados em pesquisa nas áreas de humanas, há um risco real de que importantes aspectos da história e da identidade cultural do Brasil sejam sub-representados ou até mesmo negligenciados.

A falta de reconhecimento e apoio para pesquisas em humanas também afeta a formação de profissionais nessas áreas e pode desestimular futuros pesquisadores a se dedicarem a temas importantes para a compreensão da sociedade e da cultura brasileiras.

Michelle também destaca a invisibilidade e a falta de reconhecimento da temática indígena no campo da história. Ela observa: “A história indígena ainda não conquistou o espaço que deveria ter dentro da área de pesquisa. A temática indígena sempre fica deixada de lado, é vista como menos importante.” Michelle enfatiza a necessidade de reverter essa realidade e valorizar as narrativas históricas locais, afirmando que “a nossa narrativa histórica ainda é muito pautada nas narrativas europeias.” Além disso, ela aponta os desafios políticos e financeiros enfrentados, ressaltando que “é um desafio muito grande conseguir financiamento, não só para a área de humanas, mas especialmente para projetos voltados para os povos indígenas.” Michelle destaca a importância de recursos financeiros para se conectar melhor com as comunidades indígenas e realizar atividades de pesquisa e interação, ressaltando a dificuldade enfrentada pelas áreas de humanas em obter financiamento adequado em comparação com outras áreas de conhecimento.

Portanto, é fundamental que as instituições de fomento à pesquisa e os órgãos governamentais reconheçam a importância das pesquisas como essa e garantam uma distribuição mais equitativa de recursos e oportunidades de financiamento para essas áreas. Somente assim será possível promover uma compreensão mais ampla e inclusiva da história e da diversidade cultural do Brasil.

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